A panela no fogo esperava.
Azeite de oliva, alho, sal e pimenta. Lágrimas de cebola ainda em seus olhos. Lágrimas não faltavam, desde que ele se fora.
O cheiro invadiu cada espaço vazio do apartamento. Imiscuiu-se nas fibras dos móveis, na espuma dos travesseiros, nos póros de seu corpo. O cheiro de comida. O cheiro dele.
Movimentos circulares, misturando aos poucos os pedaços de alho à textura uniforme e suave do sal. Movimentos como o de seus quadris, misturando-se à pele morena e suada que nunca mais tocaria.
Água. A temperatura cai bruscamente. No choque térmico, milhões de moléculas se quebram, misturando tempero, água e óleo. O que não se mistura passa a viver intimamente ligado, desconhecendo suas diferenças. Até que venha algo roubar-lhes a proximidade. Derramou na panela o arroz. Outra mulher. O que ela sempre temeu.
Alquimia, química... Tudo muito delicado. Equilíbrio instável. Um pouco a mais de tempero, um pouco menos de carinho. Rompe-se o elo. O delicioso torna-se intragável.
Senta-se no chão e chora. De novo. O cheiro de queimado não mais importa. Deixa a chama se apagar sozinha. Sem amor, sem jantar.
sábado, 3 de novembro de 2007
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13 comentários:
Um filme na minha mente...
Cada cena bem desenhada.
Um beijo.
sem amor... nada feito!
Um jantar maldito descrito por um belo maldito,,, Arrebentas, Moacir, na arte desbravadora do escuro... Gosto de te ler... Muito!
Abraços e deprimidas invenções!
É nesse meio termo do perder o elo que tudo vai por água abaixo.
Boa semana!
boa. cebolas sempre fazem chorar.
Olá Moacir. Esse texto é excelente. Uma idéia ótimo, bem escrita. O narrador que sente é como a cebola.
Até mais!
... corrigindo, idéia ótima. Eita, digitação.
Em cada letra desenhei a cena.
Fantástico!
Beijinhossssssss
Uau, forte, bom, muito bom!
Moacir, um beijo.
Nossa! deu um aperto no coração...
O amor nunca falta para quem se ama.
Hora de mudar os temperos, talvez até as panelas. Que nasçam novas misturas, novos sabores.
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